Candomblé de Gantois: História, Legado e Tradição Afro-brasileira
Introdução
O Candomblé de Gantois, oficialmente conhecido como Ilê Axé Iyá Omin Iyamassê ou Terreiro do Gantois, é uma das mais importantes e tradicionais casas de Candomblé do Brasil, localizada no bairro da Federação, em Salvador (BA). Fundado em 1849 por Maria Júlia da Conceição Nazaré, esta casa de culto afro-brasileira preserva uma linhagem matriarcal direta de líderes religiosas, tendo contribuído significativamente para o reconhecimento e valorização da religiosidade de matriz africana no país.
História e Fundação
- Origem e fundadora: O terreiro foi fundado em 1849 por Maria Júlia da Conceição Nazaré, uma africana liberta, originária do Candomblé da Barroquinha, posteriormente ligada ao Candomblé da Casa Branca.
- Nome Gantois: Deriva de Édouard Gantois, belga e traficante de escravos, proprietário ou arrendatário do terreno onde se estabeleceu o terreiro. O nome tornou-se sinônimo da casa religiosa.
- Linha completa de líderes: A sucessão herdada — sempre feminina — passou por Mãe Pulquéria (1910‑1918), Maria da Glória Nazareth, Mãe Menininha (1922‑1986), Mãe Cleusa Millet (1989‑1998) e atualmente Mãe Carmen de Oxaguian (desde 2002).
Estrutura física e patrimônio cultural
- O terreno ocupa cerca de 3.600 m², localizado em um alto e com acesso difícil, típico para proteger o terreiro de perseguições no passado.
- O barracão abriga o salão de cerimônias, cozinha ritual, salas de convivência, aposentos das sacerdotisas e o Memorial Mãe Menininha, com acervo de mais de 500 peças entre objetos rituais e pessoais da ialorixá.
- O terreiro foi oficialmente tombado pelo IPHAN como Patrimônio Histórico e Etnográfico do Brasil em 2002 e declarado área de proteção cultural em Salvador.
Tradição religiosa e liderança feminina
- Casa filiada à nação Ketu (Queto) do Candomblé, mantém a transmissão do comando de forma hereditária, diferenciando-se de outras casas que usam o jogo de búzios para sucessão.
- A liderança sempre feminina fortalece uma tradição ancestral, onde os cargos majoritários são ocupados por descendentes diretas das fundadoras.
Mãe Menininha do Gantois: O ícone da resistência
- Maria Escolástica, conhecida como Mãe Menininha do Gantois (1894‑1986), foi a ialorixá mais famosa da casa, atuando por 64 anos como líder religiosa.
- Lutou pelo fim das restrições legais ao Candomblé, incluindo a proibição da Lei de Jogos e Costumes que obrigava o fim dos rituais às 22h e exigia autorização policial.
- Respeitada e admirada, ela abriu o terreiro a visitantes de todas as crenças, defendendo a convivência inter-religiosa. Frequentava missas católicas — mesmo com roupas de candomblé — e convenceu líderes da igreja sobre o respeito à diversidade.
- Foi homenageada por artistas como Dorival Caymmi, Gal Costa e Maria Bethânia, e até no Carnaval carioca em 1976.
Mãe Carmen de Oxaguian: Continuidade e protagonismo atual
Desde 2002, Mãe Carmen de Oxaguian lidera o Gantois como a atual ialorixá. Ela tem se destacado na preservação da ancestralidade, promoção de ações sociais e da memória cultural da comunidade. Mãe Carmen recebeu importantes distinções, como a Medalha 02 de Julho, título de Grã Mestre Comendadora pelo estado da Bahia, e a condecoração da Unesco por promover a diversidade cultural.
Acervo e memória: o Memorial Mãe Menininha
- Criado em 1992, o memorial reúne registros, fotografias, vestes e objetos pessoais da ialorixá Menininha, distribuídos em três núcleos expositivos: sua vida pessoal, herança sacerdotal e seu espaço íntimo.
- É considerado o primeiro museu de memória religiosa afro-brasileira, aberto à visitação pública e relevante ponto de cultura em Salvador.
Importância histórica e cultural
- O Gantois é um dos terreiros mais antigos da Bahia, mencionado em estudos de Raimundo Nina Rodrigues, pioneiro da etnografia religiosa afro-brasileira.
- Representa um símbolo de resistência, ancestralidade e valorização do patrimônio imaterial do Brasil, consolidando o espaço do Candomblé na sociedade contemporânea.
FAQs (Perguntas Frequentes)
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Como surgiu o nome “Gantois”?
Vem de Édouard Gantois, belga dono ou arrendatário do terreno onde hoje é o terreiro. -
Quem foi a fundadora do Terreiro do Gantois?
Maria Júlia da Conceição Nazaré, uma africana liberta que iniciou o terreiro em 1849. -
Como funciona a sucessão no terreiro?
A liderança é hereditária e feminina, diferente de outros terreiros que usam búzios para escolher o novo líder. -
Quem foi Mãe Menininha do Gantois?
Ialorixá de 1922 a 1986, foi a líder mais célebre da casa, lutou contra a perseguição ao Candomblé e promoveu diálogo inter-religioso. -
O que é o Memorial Mãe Menininha?
Um espaço museal dentro do terreiro que abriga mais de 500 peças e retrata a história da ialorixá e da religião. -
Qual a importância cultural do Terreiro do Gantois?
É patrimônio histórico-etnográfico nacional e símbolo da valorização da religiosidade afro-brasileira e ancestralidade matriarcal.
O Candomblé de Gantois representa uma tradição viva que une fé, ancestralidade e resistência cultural. Com uma linha sucessória exclusivamente feminina e a marcante liderança de Mãe Menininha, o terreiro reforça a importância de preservar saberes ligados à religiosidade afro-brasileira. Por meio do Memorial e das ações de Mãe Carmen de Oxaguian, essa casa milenar mantém sua relevância social e espiritual até os dias atuais.
Para quem busca aprofundar-se na história do Candomblé e entender sua força enquanto patrimônio brasileiro, o Terreiro do Gantois é parada obrigatória.



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